quarta-feira, 30 de abril de 2008

Noite


Sentei-me debaixo das estrelas
Misteriosas
Luzes de marinheiros
Almas de poetas
Corações de caminhantes.
A calçada estava fria
O sol tinha partido já fazia muito tempo.
O luar resplandecia,
iluminava e encantava.
Olhei as folhas,
nas suas enrugadas faces
espelhava-se a lua,
o seu franzino caule dançava com a brisa,
os ramos abraçavam seus filhos
com ardor
calorosamente
pois só estavam prontos para voar com o vento
aquando do festival Outonal
Uma sinfonia de vida
uma homenagem à mãe.
Encostei-me então ao tronco
Forte
Majestoso
Pai e piedoso.
A sua volátil sombra
espectro cinzento
assustava os tolos
e encantava as palavras.
Levantei-me e caminhei pela relva
verde e fresca
molhada pela primeira gota de orvalho
brilhante
transparente
e a sua essência de sol
o primeiro raiar
um arco íris preso
conformado
belo
que me inspira.
Olhei então o horizonte
longínquo
esculpido nas montanhas
escavado em vidas
regado de chuva
sedento de lágrimas
e saudade,
percorrido pelas estradas
e pela Estrada.
Sobre ele
nascia o sol
esperado
venerado
omnisciente
Deus.
As cores estavam de volta
e a música
do chilrear dos pássaros,
do zumbir das abelhas
e do polinizar dos beija-flor
e com eles parto para me sentar noutra calçada fria
olhar outro luar
Escrever outro poema...

sexta-feira, 25 de abril de 2008

25 de Abril Sempre!!!!!!!!

Sentei-me no jardim, na terra aquecida pelo solarengo dia que se vivia.
Estava no meio das flores e do chilrear dos pássaros.
Gentilmente toquei as ásperas pedras quentes que estavam a meu lado.
Olhos do mundo.
Perto delas estava um cravo
Fraco e débil
Saudoso do lar
Uma qualquer espingarda de Abril
Uma qualquer arma da revolução...
A Liberdade
O espírito perdeu-se
ou Evoluiu
o cravo vermelho foi esquecido
Mas naquele dia e nos outros eu era livre
Mesmo se nem sempre o valorizei.
Contudo
o cravo de Portugal
ou Portugal num cravo
jaziam no chão...
Propósitos perdidos
Ideais corrompidos.
A Liberdade não era a mesma
Coisas que não deviam ser esquecidas estavam perdidas.
Olhei o Céu e as Árvores e pedi conselhos.
Então num virar da ampulheta
Olhei à minha volta e vi cravos vermelhos
Até onde o olhar alcançava
E quem sabe mais além.
A Liberdade de Abril
do Abril da Liberdade
subsistia.
Estava de novo viva.
Empunhada pelos jovens.
Então peguei na mais bela das pedras que estava ao meu lado
E tentei vergá-la mas não fui capaz.
Era Portuguesa e livre.
Tal como eu
Tal como nós.

25 de Abril Sempre!!!!!!!!

sábado, 19 de abril de 2008

Memória de mim


PS: A foto de hoje não é minha (DePrimeAbord). O Maracujá pediu-me uma foto de uma águia e eu não consegui tirar, mas como ele queria pus esta que encontrei no Google. O autor, desconheço.



O sol tinha-se posto e era noite de lua cheia.
Vivia-se uma Primavera fria, a primeira de todas.
Recolhi-me ao aconchego do meu ninho.
Sentei-me à lareira e enfrentei a escuridão.
Só a luz do fogo me iluminava.
Passaram-se horas, dias, anos, não sei...
A mente como o fogo, guiava-me pelas serpenteantes ruas do meu pensamento...
Quando o derradeiro fogo era somente cinza, já eu era outro alguém.
A minha impulsividade e energia eram agora sabedoria e calma.
Precisava de uma luz mais ténue, menos efusiva e irrequieta.
Então abri as minhas asas e voei...
Também aqui me perdi pelas eras deste mundo.
Poisei numa jovem caneleira em flor num qualquer jardim de um qualquer lugar.
Ali senti em toda a plenitude o abandono do vigor da juventude...
Eu já tinha sido como aquela caneleira, jovem, belo e alegre.
Recolhi a alma, apreciei aquele aroma e lembrei-me dos longínquos tempos em que percorria os céus e, serenamente, apreciava toda a beleza da Terra.
Tinha vagueado por quinhentas vidas de Homem e nunca tinha sentido semelhante aroma...
Ali fiquei até a doce vida abandonar aquela caneleira que se tornara rígida e quebradiça.
A Natureza a seguir o seu rumo.
Ergui então os meus olhos negros para o céu e vi algo como uma montanha, belo como o mar, sábio como o tempo.
As minhas asas envelhecidas voaram outra vez em direcção ao desconhecido numa aventura jovial, uma antítese de mim.
Era uma árvore...
Eu que já tinha visto todas as árvores, minhas amigas de viagem e de contos nóctivagos, não consegui reconhecer aquela...
O olhar turvava-se-me, pensava eu...
Eu que tinha visto a chegada dos primogénitos estava pela primeira vez surpreendido.
Poisei então nela.
Era uma frondosa faia, a mais bela, sábia e velha de todas as árvores...
As suas folhas eram de três cores já esbatidas e cansadas.
Dela provinha uma luz comparável à da grandiosa lua.
Poisei no seu ramo mais alto e os meus olhos ganharam outra vida.
Contaram-se histórias sobre mim e sobre a derradeira árvore...
Éramos apenas um rumor esquecido, uma história de caminhantes, um verso de poetas errantes.
As Primaveras sucediam-se até que surgiu uma tão fria como a primeira.
E eu pressenti o fim.
Mas a minha percepção do mundo era agora diferente.
O fim era o começo de mais uma etapa...
No final daquela Primavera o cheiro das caneleiras voltou, inundou-me o espírito e aqueceu-me a alma.
Então percebi, abri as asas e deixei-me levar...

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Vida...



Vazio... Inexistência...
Numa explosão de luz, numa melodia de pensamento algo foi criado.
Era ínfimo mas vivia.
A sapiência daquele que viu o Vazio, que o acompanhou, era infinita.
O Tempo tudo via e recordava para quando o Vazio voltasse.
Aí falarão eternamente numa conversa melodiosa, a mais bela de todas.
Jamais alguém a ouvirá.
O seu eco prolongar-se-á até sucumbirem o Vazio e o Tempo...
Porém quando tudo era ainda uma manhã, uma flor ténue, verde e franzina nasceu a vida.
A Vida, ao contrário de tudo o resto, desabrochava rapidamente.
O Tempo, avô, olhava-a calmamente e sorria terno e acolhedor.
O brilho nos seus olhos cinzentos tudo encandeava e a Vida passava eras a olhá-los pois revia-se neles.
E viu-nos.
Éramos ainda réstia de pensamento.
Algo estranho, capaz de amar, pensar. Algo diferente...
Nascemos...
Fomos os primeiros que não foram alvo de extensa premeditação, assim estava traçado o nosso destino.
A Vida foi o nosso berço mas por pouco tempo.
Ansiávamos liberdade, correr pelas planícies verdejantes e calcar as folhas outonais caídas no chão, apenas uma lembrança da vitalidade de outrora.
Tornamo-nos justos, rectos e belos.
Porque efusivos nunca compreendemos a dádiva da morte.
Dela queríamos fugir, da presciência que se adquire às suas portas.
Talvez porque éramos demasiado velozes para sermos preenchidos pela sabedoria.
Os Reis sucediam-se até o sangue dos primogénitos estar diluído pelo tempo e pelos traidores.
Quando tudo estava disperso e sem sentido a vida acabou.
A derradeira morte tinha acontecido.
O Vazio regressou e as palavras começaram a correr para nunca mais parar...

domingo, 6 de abril de 2008

A estrada

Nasci.
Olhei para a frente e pressenti o destino.
Não havia retorno e nada era certo.
Acossado pela sua força segui sempre em frente.
Caminhei pela vida, abri a mente e segui a estrada.
O sol punha-se mas eu não.
E de noite quando a esfera prata sorria para mim, eu percebia porque era um caminhante.
De manha, quando se via o primeiro raiar de luz ainda verde e fraco eu retomava a minha caminhada.
Falava comigo, via-me nos animais e sentia-me nas plantas.
Mas não parava...
Com a segurança da experiência via a estrada que serpenteava até aos recantos mais profundos.
E eu por ela deambulava...
Era acompanhado pela brisa, intempestiva companheira mas de coração brando e justo.
Os montes que via depressa eram ultrapassados e as imponentes montanhas geladas, oásis de desafio, eram minhas velhas e sempre presentes conhecidas.
A natureza era a minha casa, amiga e confidente.
O tempo caminhava comigo e os meus cabelos com ele.
O sapientíssimo branco foi dele uma dádiva.
Mas a minha capa continuava inquieta e o meu coração decidido.
Um dia parei e caí.
Deixei de sentir, de olhar e de caminhar.
Ela deu-me a mão e levou-me para cima.
Confortou-me e devolveu-me a mim...
E fiz o que melhor sei fazer:
Caminhar...

sábado, 5 de abril de 2008

Perdido



Olhava à volta e nada via.
Sentia-me escuro, negro...Pensamento de Carvão.
Só se pressentia a penumbra das almas e a putrefacção das árvores...
Ali tudo era cinzento, memória dos tempos prósperos.
Ouvia-se somente a música do silêncio.
Ela entoava, preenchia-nos e aí a mente, apaixonada, deixava-se levar...
O rio que outrora corria cheio de vitalidade sentia agora os amargos traços da velhice e aquelas correntes fortes e de uma rude gentileza que guiaram os heróis por tempos intermináveis estavam agora estagnadas. Eram só uma ligeira lembrança dos tempos áureos.
Tal como eu...
O sol não brilhava, a brisa não soprava... Desde há muito tempo.
As árvores murmuravam. Aquela voz enrugada pelas Primaveras entristecia com o passar dos tão curtos dias... Os seus rebentos estavam secos e a sua vida sem sentido. Como elas precisavam de um pastor.
O tempo, teimoso vizinho, insistia em passar e o presente deu lugar ao passado inatingível...
Mas, num dia a todos tão igual surgiu a luz no Oeste... Ela ofuscava, brilhava, queimava, era radiosa como a manhã, bela e perigosa como o Oceano... Ondulava até onde a mente permitia. E mais longe não ia!
Então no meio de todo o cinza e desespero nasceu algo belo, irreverente e ainda franzino. Um prelúdio de um futuro diferente.
A água voltou a correr e eu também!

terça-feira, 1 de abril de 2008

(Anesthesia) Surgery



E aquelas duas portas negras abrem-se para a luz...
A cura era visível mas tão distante...
Deitei-me no duro leito da regeneração... A partir dali estava para além de mim...Estava impotente...
Puseram-me a máscara do nada e caí em descanso...
O corpo nada sentia mas a alma esta viva e acesa. D
eu-se o primeiro corte... Enfrentei-o como uma criança que oscila entra o medo do longínquo desconhecido e a incontornável curiosidade.
Ri-me,ri-me de mim.
Tudo era tão branco e limpo.
O meu corpo era deles mas eu não.
Eu, voava, via a precisão daquelas mãos que tudo controlavam e os olhos que até a rainha das águias que vive lá no alto, no alto do mundo a que só o pensamento alcança, invejaria.
Sentia-me frio... A morte assustava-me...
Aquela imensidão de nada, a profunda escuridão, a simples ideia da não-existência dava-me arrepios.
Eu era alguém...
Mas... Não sentia medo. Ela sorria-me, sem saber.
Ali estava eu, nu de corpo e alma à mercê de um estranho, um anjo da vida de luvas brancas.
Senti-me a voltar ao meu lar.
Doce Corpo.
Aquela viagem pelo tudo e pelo nada, em que o tempo não era obstáculo tinha acabado.
Respirei...